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Gaúchos em Cena: Paulo Flores – Um teatro com pedra nas veias / Roger Lerina


20/09 às 18h – Centro Municipal de Cultura

Uma festa para Paulo Flores

por Roger Lerina

É inevitável falar do Ói Nóis Aqui Traveiz quando o tema é teatro contemporâneo na América Latina – e absolutamente impossível não destacar Paulo Flores ao citar essa projeção da Tribo de Atuadores. Há 41 anos, quando criou com alguns colegas de teatro esse grupo que leva o nome de disco do Demônios da Garoa, Paulo tinha certeza de que estava buscando uma linguagem cênica singular – mas dificilmente tinha ciência de que deflagrava uma revolução. Primeiro estudante de teatro, em seguida ator e diretor, depois dramaturgo, encenador e produtor, finalmente – e sobretudo – atuador: o guri que dirigia um punhado de primos em recriações de sequências de filmes para a plateia familiar na fazenda da avó em Bagé acabou mais tarde congregando em Porto Alegre em torno de suas concepções dezenas de artistas jovens e idealistas, responsáveis há quatro décadas por montagens premiadas e aplaudidas internacionalmente.

Criador inconformista, que investe todas as energias em produzir um teatro de caráter transformador e redentor, Paulo lançou-se desde o início de sua trajetória em um trabalho radical e inovador, mirando na busca de expressões cênicas que fossem tanto transgressoras da estética então vigente e cordata quanto confrontadoras das instituições sociais e políticas. Instituiu a democracia horizontalizada da criação coletiva, abraçou a produção em comunidade e mergulhou em uma pesquisa teórica e prática do teatro cujo amálgama segue até hoje sendo moldada – um caldo espesso que propõe a síntese entre Brecht e Artaud, une o experimentalismo anarquista do The Living Theatre e a carnavalização dionisíaca do Teatro Oficina, conjuga o teatro do oprimido de Augusto Boal e o teatro pânico de Fernando Arrabal, revisita as ancestrais histórias e os mitos dos gregos e de Shakespeare e ainda ecoa vozes modernas como Samuel Beckett, Heiner Müller e Christa Wolf, atualiza os ensinamentos de Meierhold, Grotowski e Barba, investe no que chama teatro de vivência, apresentado em espaços fechados, e também no teatro de rua.

Avesso ao personalismo, Paulo Flores certamente não fica à vontade com a festa em torno do seu nome – para ele, o que sempre importou foi a densidade e a relevância do trabalho, feito de forma coletiva e acessível ao maior número de pessoas. O Porto Alegre em Cena, porém, não poderia deixar de registrar a contribuição desse mestre do teatro latino-americano na coleção Gaúchos em Cena: o volume de 2019, portanto, é dedicado a Paulo Flores. Por meio de entrevistas com o homenageado e depoimentos de atuadores, ex-companheiros, amigos e pesquisadores, o jornalista Roger Lerina retraça a trajetória artística e pessoal desse artista inquieto, talentoso, íntegro e, como os leitores de Paulo Flores – Um Teatro com Pedra nas Veias descobrirão, extremamente generoso.

(Foto: Eugênio Barboza)

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